Sempre a reforma agrária
Euclides Neto
Tribuna da Bahia - Salvador - BA - 1997
Quem leu as declarações recentes do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Sr. Milton Seligman, pode imaginar que os sem-terra estão envolvidos na corrupção do órgão que ele dirige, seguindo, aliás, parte da mídia desinformada. Mas não se deve confundir o Movimento dos Trabalhadores (MST), organização civil, com o Incra, repartição pública. Os associados de um não são funcionários públicos do outro, óbvio. Muitos estão querendo dar a ideia que tudo é a mesma coisa.
Confundir essa realidade tão simples (ou subliminarmente tentar fazê-lo), além de má-fé, é o mesmo que culpar os doentes pelos erros e desvios dos hospitais públicos. Os trabalhadores não passam de pacientes do Incra. Às vezes, os menos avisados e os mal-intencionados pretendem dar a ideia de que a Reforma Agrária é a causa da corrupção.
Quando o sr. Seligman informa que a supervalorização passa por 800 milhões de reais nas desapropriações dos últimos seis anos, parece que os sem-terra também são desonestos, quando são vítimas.
Por outro lado, confessa, com honestidade, os erros dos seus antecessores. Gostaria que o fizesse em relação aos próprios. E dá a impressão de que só há um meio de evitar o roubo envolvendo quase um bilhão de reais: parar com as desapropriações. Em tudo isso está incluído o escritório da Bahia que anda em peias para esclarecer as denúncias, o que não significa, até aqui, culpabilidade.
Parabéns ao Sr. Seligman em afirmar, livrando a pele, que até junho, já no governo Fernando Henrique (de dedos limpos – Deus tá vendo!), 22% das fazendas foram avaliadas por preços acima da média.
Bom esclarecer que no Incra existe um foco de espertezas. Porém não se pode deixar de reconhecer que também lá estão servidores do que há de melhor (e olha que tem muita gente boa) no governo – verdadeiros heróis, que, às vezes sofrem por serem corretos.
Seria aconselhável fechar os hospitais por que neles médicos e enfermeiras cometem desvios? Jogaríamos no lixo o Congresso pela mesma razão? A Justiça? Os do Executivo? Teríamos que parar tudo.
Não é justo, portanto, deixar de desapropriar, e se crie uma entendida abstrata chamada Reforma Agrária envolvendo, como culpados, quem mais está sendo prejudicado pelos desmandos.
Quanto à afirmativa do Sr. Seligman que em cada estado existem pelo menos cinco assentamentos com sucesso, o que é muito pouco, a culpa também não é do MST.