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Pedimos sugestões

Euclides Neto

A Tarde - Salvador-BA - 1988

Estamos preocupados em discutir o modo de conviver com as secas. Para tanto, precisamos da ajuda de todos. Pedimos sugestões. Evidente que gostaríamos de tê-las baseadas na realidade do semiárido. Nada do sofisticado Israel, dono de todo dinheiro, tecnologia e obstinação mística, que não possuímos. Nada de projetos à Flórida, com os dólares enxundiosos. Nada de projetos pensando em cultivar orquídeas, criar chinchilas e trutas para exportação no Morro do Chapéu. Queremos soluções com palmas, bodes, farinha de mandioca, aguadas abertas no quadro do meio da presa, oferecendo menos incidência às sôfregas línguas do sol, empregando ao máximo o braço humano, sem medo de sermos chamados de retrógrados, quando a era é das máquinas, do botão que substitui milhares de homens e até exército, mas desempregam os despossuídos.

Gostaríamos de ouvir lições da sabedoria popular, de como conservar abóboras, rapadura, batata-doce, castanhas, fardos de feno amarrados à mão, como se faz com as batatas, chouriças, queijos e conservas na Europa durante o gelo. Será que a certeza do rigor do inverno lá é que ensina o homem a guardar a comida para sobreviver juntamente com as criações, enquanto por aqui sempre se espera que a estiagem não aconteça? Se o verão prolongado chegasse todos os anos com a mesma pontualidade dos invernos temperados já não estaríamos precavidos para ele?

Rogamos que os entendidos nos digam se a palma forrageira, por exemplo — vasilha de 92% de água e uma pitada de proteína —, é mesmo a árvore santa do Nordeste! Que não devemos explorar muito as lavouras exigentes em chuvas bem distribuídas, mas, sim, criar animais adaptados, aproveitando a caatinga exuberante nos períodos chuvosos (600-700 milímetros), enquanto a média da Europa não vai a tanto!

Que acham de tanques que aproveitem a água de todos os telhados, aumentando estes na zona rural com a mesma finalidade, e mais a de agasalhar o feno e as reservas para o tempo ruim? E que tais telhados ficam baratos, pois que as madeiras serão apanhadas pelo sertão mesmo — roliços e rústicos! E tantas canalizações de água que passam indiferentes pelos terreiros da zona rural, sem conceder uma penugem d’água, e vão para as cidades lavar carros, encher piscinas, molhar ruas para evitar poeira! E pelos canos também entram os roceiros em busca da rua... E depois se pergunta qual a razão do êxodo rural!

Que acham de: a) pequenas irrigações onde possível? Sobretudo pequenas irrigações!!! Que as monumentais sejam feitas por quem tenha recursos, créditos e saibam operar no open!; b) proteção ao preço do sisal, mesmo com os subsídios, que ficam mais baratos e eficientes que os programas de combate à seca quando ela se instala!; c) e proteção ao plantio planejado de mandioca para que o preço da farinha não caia hoje e, amanhã, esteja mais alto que o do pão, como atualmente; d) campanha de esclarecimento para que as famílias voltem a torrar o café, bem como a pimenta cominho e o milho, a fim de não transferir custos com energia, transporte, mão de obra, embalagem, adicionados pela indústria! Além do preço da propaganda para dizer que o café “Periquito” é o melhor e mais saboroso!

Devemos conviver com a seca, gastando os recursos para o seu combate, durante a crise, em programa contínuo, de todo o tempo, preventivamente? Sobretudo depois que chove!

Alguém tem ideias para evitar a evaporação que bebe 60% das chuvadas? A água da caatinga deverá ser bem guardada em recipientes tampados, como o éter, e não em pratos rasos, expostos ao tempo como as aguadas costumeiras?

Melhor poços semiartesianos, ou presas? E onde uns e outros?

A seca, como visto, é um problema de todos? Também ela, igual ao latifúndio improdutivo e os juros bancários, tange o homem da terra, entulhando as cidades? Mande-nos as sugestões. Endereço: Secretaria da Reforma Agrária e Cooperativismo — Av. Santiago Compostela, s.n. — Ed. Monte Rey — 2º andar. Participem, assim, da administração pública, inaugurando, aqui, o mutirão das ideias. E muito obrigado.

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ipiaú-BA (1925-2000).