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O preço da comida

Euclides Neto

A Tarde - Salvador-BA - 1996

A inflação continua caindo. Ótimo. Acontece que, como sempre, quem está pagando o pato é o produtor rural. Agora mesmo foi noticiado que os gêneros alimentícios despencaram para que se chegasse a tal resultado: carne, ovos, arroz etc. Mas os insumos continuam, sorrateiramente, subindo. Como um cai e o outro sobe, vão se encontrar (em muitos casos, já toparam em ponto indesejável). O que se levanta comerá o que tomba.

 Sabemos que a atividade agrícola sofre cada vez mais riscos: sol, sequelas da instabilidade financeira e de preços. A rigor, quem planta é um alugado dos bancos. O lucro, quando existe, cai em seus cofres. Se fica devendo, o lavrador pagará na outra safra como todos os meeiros. Escravo.

 Guy Sorman em seu livro Verdadeiros pensadores de nosso tempo conta-nos que em 1966 os Estados Unidos providenciaram socorros à Índia faminta. Só que, lentamente, Johnson tentava trocar navios carregados de trigo pelo apoio à política americana no Vietnã. Foi então que Indira Gandhi resolveu que nunca mais haveria fome no seu país. Livrar-se-ia da humilhação e da chantagem. Convidou Swaminathan, o agrônomo responsável pela pesquisa agrícola indiana. Ordenou que ele produzisse em cinco anos um estoque de cereais igual aos 10 milhões recebidos da “ajuda”. Vinte e dois anos depois a reserva chegava a 50 milhões de toneladas, exatamente o que tinha a Comunidade Europeia.

 O célebre agrônomo adotou procedimento básico e simples:

  1. a) agricultor pobre só investe em novas técnicas se for proprietário da sua terra e se puder vender o excedente por preço vantajoso;
  2. b) se conseguir lucro satisfatório, pode até se arriscar financeiramente;
  3. c) a “revolução verde” só dá certo se o lavrador tiver justa remuneração dos seus esforços;
  4. d) a condição para escapar da fome é a redistribuição da terra às famílias do campo e o respeito à pequena propriedade.

 Como se vê, há uma ênfase muito forte ao resultado econômico. É injusto baixar a inflação com o desestímulo dos que plantam e criam. Uma das razões também do êxodo rural. Os da cidade querem ter comida barata, mas não vão lavrar mandioca nem curar umbigo de bezerro.

Swaminathan chama também a atenção para outro fato: as sobras nos países que as compram (no caso a concorrência dos importados no Brasil) faz baixar os preços arruinando os agricultores locais, provocando a queda da produção e o aumento do desemprego.

 Não me venham falar em produtividade e competitividade para exportar, quando ainda estamos na era da enxada, e, estupidamente, há resistência a uma política de melhor distribuição da terra improdutiva.

 

 

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).