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Onze mandamentos do fazendeiro de cacau

Euclides Neto

A Tarde - Salvador-BA - 1995

 

  1. Plante em terra boa, macia, sem cascalho, sem barro de telha, ou arisco preto, que sofrem com o sol e até com excesso de chuva. Antes, repare na vegetação que cobre o solo. Tararanga, imbaúba-branca, taboca, sapé, fumo-bravo, são sinais de terras fracas, que só produzem com muito calcário e adubo. Colha o cacau maduro e venda produto superior;
  2. Fazenda não é clube social. Não construa sede para exibir-se: piscina, pisos de granito e suítes de luxo. Use portas de madeira maciça, telhas bem queimadas, cômodos amplos, varanda confortável que não cause sentimento de culpa e desperdício;
  3. Edifique estufas e barcaças com material escolhido, mas também simples e sóbrias. Sem rococó. Economize;
  4. Dê casas boas e higiênicas aos trabalhadores, para que vivam bem. Se possível, com água encanada e luz;
  5. Tenha um jardim, como aconselhava Bromfield. E uma boa chácara, com fruteiras da região. Venda flores e frutos que sobrarem. Dinheiro ruim é o que sai. Preserve a fauna e as essências florestais, o que lhe dará muito prazer espiritual. Melhor se você morar na fazenda;
  6. Venda cacau na balança. Jamais na flor. Já houve tempo em que intermediários preferiam até não recebê-lo, para que pudessem cobrar reajustes em preços e prazos. Previna-se: vários fatores influem para uma frustração de safra-sol, podridão, vassoura, peca, roedores de todos os tipos;
  7. Não diga que colhe mais do que o real. Esta mentira repetida leva você a se convencer que colhe mesmo e vender mais do que o que pode. Diversifique a produção;
  8. Lute por sua cooperativa. É ela que lhe dará a melhor classificação, preço e peso na balança, e distribui as sobras (lucros) que iriam para os atravessadores;
  9. Deixe sempre um pouco de recursos para esperar o temporão vindouro;
  10. Faça o possível para não assumir compromissos;
  11. Muito importante: tenha o trabalhador como um grande amigo. Ouça-o. É ele quem colhe a roça, com chuva, trovoada, sol, pixixica, cisco nos olhos, arriscando-se a ser picado por cobra. Você normalmente fica em casa, no enxuto, no conforto, acordando a hora que entende, enquanto ele tem que sair no horário frio do inverno e dá o suor, até o sangue quando sofre cortes de facão, machado, podão. Ele é bem melhor do que o que você pensa, e mais desarmado de espírito que você. Ofereça-lhe um pedaço de terra para plantar o de-comer. Se tiver dúvidas, tome-lhe um contrato de parceria, comodato, mas não deixe perder a vocação de plantar — ele e a família —, podendo ainda criar seus pequenos animais. Trabalhador bem alimentado é braço melhor na labuta. Veja como você cuida do seu cavalo de sela, da vaca de leite, do cão de guarda. O trabalhador é igual a você. Pode até ser melhor. Sem ele você jamais usufruiria de uma fazenda de cacau. Assim, você teria uma mina de alegrias!

 

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).