O Brasil ficou mais fácil
Euclides Neto
Tribuna da Bahia - Salvador - BA - 1993
Foi até bom o resultado da última eleição presidencial. Não pela vitória de Collor, evidente. É que somente agora Lula ficou pronto. Digo mais: lapidado. Sem risco de frustrar o povo. E vacinado para as duas maiores desgraças do poder: a corrupção, hoje acuada, e a prepotência.
O Brasil também ficou mais fácil, sobretudo no campo das ideias. O mundo passou por mudanças verticais. Antes, havia verdades dogmáticas: de um lado a Rússia como modelo de regime político para muitos; do outro, os Estados Unidos. Ambos escancararam os seus equívocos. O socialismo continua vivo, mas advertido de que sem liberdade não se sustenta. Constatou-se que os valores universais, acumulados pelo homem através da história, não podem ser substituídos por uma só visão, mesmo que seja pela genialidade do marxismo. Os Estados Unidos envelheceram. Acumularam fabulosa riqueza e viraram o ancião que no fim da vida continua milionário, mas sem condições de dirigir a própria fortuna. Caducou muito rapidamente. É que não há império sem decadência, após o enriquecimento. O neoliberalismo, que é autofágico, degrada-se. Os parceiros, somente nos tratados escritos, solapam-se na disputa da economia de mercado. Em outra modalidade de guerra fria. O desejo consciente ou inconsciente do Japão é jogar uma bomba atômica, chamada competitividade, sobre Nova Iorque. Muito mais arrasadora que a de Hiroshima. Enquanto houver mercado para os grandes, inclusive o recíproco, a coisa vai equilibrando. Mas o barco começa a balançar. Chegará o momento em que os ricos não terão mais a quem explorar.
Lula, portanto, pode inaugurar um sistema brasileiro dentro da atual realidade, aproveitando fatos históricos que presenciou. Assistiu aos dois grandes voltando da viagem que fizeram em busca da utopia, que não encontraram. Por esses caminhos não perderá mais tempo.
Outra vantagem: deixou os naturais arroubos da juventude, ampliados pelo sucesso da vertiginosa escalada política. Agora está maduro. Muito viu, ouviu e sentiu pelo mundo. Quando peregrina pelo interior ou acampa na favela, não é por demagogia. Precisa mesmo botar o ouvido no peito do enfermo chamado Brasil.
Àquela época, os quadros do partido estavam verdes. O PT era menino. Agora o cano fumegante do fuzil de Genoíno esfriou. Governaram capitais, foram ministros. Erraram, acertaram, divergiram. Sempre democraticamente. Lula aparou a barba. Suplicy ficou mais careca. Baixaram as labaredas da euforia. Descobriram que uma coisa é o palanque da greve e outra é a carteira da rotina administrativa.
O Brasil ficou menos hipócrita. Prova-se que quase todos os envolvidos nas falcatruas (orçamento, compra de deputados por outros) são da direitaça, vinda do regime militar: joães, fiúzas, collores.
Lula constitui uma esperançosa ruptura democrática na vida brasileira, sem os riscos de radicalismo, pois que as ideias ficaram mais claras e o Brasil mais fácil.