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Homem Anfíbio

Euclides Neto

Folha do cacau - Camacan - BA - 1986

Será que políticos vertebrados suportariam a plasticidade da liderança de um cidadão que é capaz de, ao mesmo tempo, rebolar sob todos os ritmos partidários?

Vejamos do que se trata: ele era do PDS, defensor da inquisição revolucionária, apoiou todas as torturas e desaparecimento de presos, ficou com o regime até que lhe deu o último golpe. Encontrou o leão estrebuchando, em coma, vencido e acuado, combatido durante um quinto de século. Aplicou, então, a última estocada e ganhou fama de autor do gol da vitória, apesar de haver somente encostado o pé na bola, na conclusão. Tão dúbia a jogada que, ao certo, não se sabe se foi gol contra. Existem os que admitem que ele era instrumento de uma provocação capaz de desencadear uma reação militar. Como o leão estava morto mesmo (ou o gol já estava mesmo feito), o esperto aproveitou-se do evento e cresceu na ingenuidade dos incautos, traindo quem lhe autorizara a encenação.

No momento que lhe convém, por não suportar a sigla que até ali cultuara, domina um naco da outra — o PFL. Tumultua tudo, espalha brasa, mas arromba a porta.

Compra o PTB, deixando na gerência um servo servil. Consegue dominar a fraqueza de certos elementos do PMDB. O seu candidato é do Partido SOCIALISTA Brasileiro que, pelo próprio enunciado (SOCIALISTA!), abomina tudo que pertence ao Ku Klux Kriolo.

Até aí tudo bem, admitamos. Segundo uns, a política é a arte da acomodação para vencer. O Malvado gostaria de apresentar um candidato de rédea feita, mas submeteu-se ao de queixoduro, sestroso: imposição dos tempos e do povo que não mais suporta o Maria-Vai-com-as-Outras.

Tudo bem, repito. O que entristece é a subserviência dos que, sob o cabresto do montador, acomoda-se a não ter direito, sequer, a escolher o partido. Ou sair da lama original. Terão de ficar lá tomando conta da retaguarda, cuidando dos mortos e feridos, dirigindo o PDS, sem opção, eis que essa é a vontade do Grão Senhor. Conquanto deputados federais, eleito pelo voto do povo (a essa altura cativos dos votos do Homem e não do povo!), não têm querer: eunucos.

De espantar que uma geração de políticos saia tão subserviente e conformada. Sem qualquer independência, já não digo ideológica. Têm consciência de que estão traindo o PTB (ou este foi mesmo criado para servir de coringa no jogo?), ou de continuar no PDS como o responsável pelas três pancadinhas finais da satisfação fisiológica, porque, já estando na escuridão, não tem mais luz para apagar.

Quando os do futuro interpretarem o fenômeno, não saberão o que mais admirar: se a esperteza do Homem Réptil-Voador (capaz de viver na água, terra e ar) ou se os políticos tão submissos.

E tão contraditórios, inclusive o Maior de Todos que, abominando o Socialismo, a ele adere, tentando salvar a pele, já que a sigla partidária original virou molambo.

Consequentemente, no dia (se!!!) que se instalar o comunismo no Brasil, ele será Ministro das Comunicações. Jeito e jogo de cintura é que não faltam ao dito e aos seus pares.

Há uma certeza, contudo: a história terá nojo deles.

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).