Banco do Brasil e lucro
Euclides Neto
A TARDE - Salvador - BA - 1991
Sabemos que o grosso das ações do Banco do Brasil destinadas ao público vai se concentrando nas mãos de poucos, cumprindo a lei dos ricos. Também não é segredo que tais acionistas são poderosos e influem na política econômica de um modo geral. Daí ser fácil concluir: não tendo eles o controle de direito da S.A., têm-no de fato.
Cremos, pois, que tais cidadãos, devotos da livre empresa, fugindo das bruxas estatais, não querem o BB cumprindo a sua verdadeira função: incentivar a agricultura, a indústria, o comércio, a distribuição da riqueza, o emprego, o poder aquisitivo da maioria. Pensam em gordos balancetes, anunciando lucros como se fosse um usurário estabelecimento particular. A isso chamam de competência, competitividade, modernidade.
Pouco importa que tal lucro seja arrancado do criador de bode das caatingas de Campo Alegre de Lourdes, do pequeno comerciante de Itaquara, do artesão de mobílias rústicas instalado lá para as bandas de Buritirama.
Querem o lucro!
Não sabem, os responsáveis por tais desatinos, o que representa uma agência do Banco do Brasil em Tabocas do Brejo Velho. Se sabem, isso não lhes toca. Desconhecem a realidade de um lavrador sair da sua roça, viajar léguas, às vezes na canela, à procura do crédito honesto. E não ter onde pernoitar! E voltar para casa em busca de um documento. E retornar léguas de areias escaldante, matas, caminhos sem transporte, rios, tudo cada vez mais longe. Bom seria mandar um almofadinha desses ao Ramalho, em tempo de chuva, dando-lhe de vantagem dois jipes tracionados, para um desatolar o outro, buscando Carinhanha, onde certamente ficará a única agência da região.
Não lhes interessa o papel educativo de uma elite de jovens (aí é elite mesmo no melhor sentido — moral, intelectual ético), levando hábitos de higiene, escolarizando profissional e informalmente agricultores, comerciantes, microindustriais, orientando-os. Transformando comunidades, fazendo mais que todos os políticos reunidos — resultados econômicos e sociais que não são contabilizados nos balancetes. Isso não conta. Importam os resultados semestrais dos cifrões. E vão esvaindo o interior, cortando os seus canais de irrigação financeira, enfartando-o, necrosando-o, isolando-o, tangendo a população para as cidades maiores, entulhando-as.
Querem o lucro!
Em vez de Feijão-Vida, Conta-Farinha, Arroz-Card, querem Ouro-Vida, Ouro-Card, Conta-Ouro. Assim aconteceu com Midas, quando tudo em que tocava virava ouro. Morreu de fome.
As agências virão para as concentrações urbanas, onde se aglutinam as poupanças, os depósitos, em detrimento dos tabaréus, catingueiros, mateiros, barranqueiros, gerazeiros. Sugerem agências lucrativas no Caminho das Árvores, em Ondina, na Av. Centenária. Em nome da modernidade dos resultados financeiros, os donos da minoria acionária mandam nas decisões do governo. Querem assim. Assim seja. Mesmo que cada vez mais tenham que andar apavorados com os sequestros, morar atrás das grades, protegidos por cães e escopetas.
Querem lucro de moeda sonante.
A ordem é descartar funcionários como se fossem objetos usados. Trancar agências e postos. No fundo, no fundo também, é que o Banco do Brasil é o último reduto de seriedade. E pretende democratizar a economia — o que não aceitam.