A água e os agrotóxicos
Euclides Neto
A TARDE - Salvador - BA - 1985
Imagina-se que para resolver a seca basta fazer açudes, aguadas, perfurar poços. Enfim, reter a água. De preferência protegê-la de tal modo que ofereça a menor incidência possível a quem a lambe pela insolação. E que os rios, ribeirões e olhos d’ água continuam a fluir, oferecendo-se dadivosos, e todas as conchas hidrográficas são eternas, puras como a “fonte sonora e fria correndo levando a flor”.
Contudo o Paraguaçu está envenenado. O “Curral das Águas” (título do livro de Wilson Luis, que ele guarda sob sete capas), também conhecido por Lago de Sobradinho, com seus milhões de metros cúbicos líquidos, está apodrecendo. O das Contas virou esgoto, aparando a concentração dos homens que antes disseminavam as suas porcarias na rarefação das moradas. Juro que as areias dele eram cor-de-rosa, as piabas d’ouro, prateadas. Hoje é lodo.
Está aí a dificuldade. Sobretudo no semiárido. Antes, os rios percorriam distâncias, procurando bondosamente os homens nos vales, oferecendo as águas, dessedentando-os. Agora, inutilizadas! Vejam o Rio Salitre que refrescava os Campos Formosos, dirigindo-se a Juazeiro. Também está sujo.
Então, chegamos a uma realidade. À medida que guardamos água, artificialmente, as fontes naturais ficam imprestáveis. E, por mais que aguadas sejam construídas, jamais alcançaremos a fartura dos rios que em suas imensas adutoras disparavam em busca dos horizontes marítimos, limpos.
E os poços tubulares? Certamente com medo do homem, a natureza escondeu águas no fundo da terra, nas gretas das rochas. Porém, não levou em conta o aparecimento dos agrotóxicos que, pacientemente, penetrariam o chão, desgraçando também as reservas subterrâneas.
Seria, então, melhor e mais barato que gastássemos verbas com obras novas e outras tantas com a fiscalização e conservação dos mananciais ainda não degradados. Porque temos menos água boa atualmente que no século passado.