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A história de Ipiaú

Euclides Neto

Artigo em “Um prefeito” - Ipiaú - 1969

A história do Município não tem grandes rasgos. Nenhum grito do Ipiranga, nem Cabrito ou Pirajá. Nada. História boba. Estórias desemxabidas de pessoas e bichos que mais dariam em romance, também tolo, desses que andam por ai.

Primeiro a mata pujante, fria, úmida, de folhas lustrosas. Tropical por excelência. Índios Tapuias. Rios lerdos e gordos de peixes. Caça farta.

Depois, como sempre, o homem chegando. Para aqui veio corrido de Jequié, Areia, Maracás, Castro Alves. Um deles; em vez de uma, trouxe duas mulheres e se instalou na mata. Mais fugindo à justiça que para possuir a terra.

Outros homens surgiram depois. 1906. Esturricaram as terras de lá com as queimadas e partiram em busca de outras virgens: “tapuia” que usava machado, andava vestido e, possivelmente, já votava. Veio primeiro atrás do óleo de cupaíba: e achou ipeca na mata agreste. Começou o negocio de um e outro. Vendiam em Camamu.

No sul do Estado da Bahia – Ilhéus – cacau virava ouro. E as terras do então Rapa Tição (depois Alfredo Martins, Rio Novo, Ipiaú, afinal) eram soberbas. Tinham viroto, mucuri, pau d’alho e dava cacau. E os homens apareceram. Buscavam comida (açúcar, sal, jabá) em Camamu. E pólvora, chumbo, espingarda. Jogavam as sementes nos roçados. Tratavam, ainda das que o jupará plantava. Cinco anos depois íam pagar os débitos. Neste vai e vem abriram-se os caminhos de burro, trilhos apertados nas encostas, pulando rios, abrindo degraus. Aqui e ali, numa encruzilhada, nas passagens, uma bodega, o dono morando dentro.

Mais comércio de cacau.

Usura.

E a terra que se entregara mansa e dócil, quase no cio, começou a ser possuída à força: a repetição papo amarelo, o trinta e oito, o parabélum fizeram suas leis. Leis duras, mas lei. Lei de todas as terras que se valorizam rapidamente e passam a ser violentadas pelos desbravadores; homens de terras outras que instalaram a história do “caxixe” das negaças judiciais e, também, do trabalho, da luta honesta em arranjar o feijão e a farinha do meio dia. Uns morreram debaixo das derrubadas, atravessando rios cheios, de impaludismo, de coice de burro, ofendido de jaracuçu, cabeça de patrona, à mira certeira de rifle tocaieiro. Muitos foram declutidos na seleção natural do processo capitalista. Outros ficaram ricos, engrandeceram o Estado, a Pátria e ainda vivem.

É a segunda fase da história: os fazendeiros que tem poupanças, filhos, genros-querendo o Município Modelo: com indústria, centro de educação agrícola, hospitais, escolas, bibliotecas, estradas, esgotos, drenagem dos rios brabos e traiçoeiros de antigamente. Já se cochicha em escola de Filosofia. Não há mais papo amarelo, a não ser nas decorações de casas de fazenda, ruídos de ferrugem, cansados de muita estória, aposentados.

Há também os operários que amassam a riqueza e esperam dias melhores.

Há os posseiros que plantam comida: milho, feijão, mandioca, laranja, lima, cravo da índia. E criaram galinha, porcos.

Há os que nada são: deram as forças, foram usados, estragaram-se nos eitos, nos currais, pariram pencas de meninos à tôa e estão nas portas da rua: sucatas de gente.

Há os liberais: médicos, engenheiros, advogados, agrônomos, veterinários, professores.

Os artesões.

Os estudantes.

Os bancários.

Os comerciantes.

As lavadeiras.

Os funcionários públicos.

Os católicos.

Os protestantes.

Várias religiões.

E crendices.

Os homens bons. E alguns maus, pouquíssimos, graças a Deus. Todos querem bem a Ipiaú e estão desejosos de escrever, unidos, a sua nova história. Inclusive para demostrar que podemos fazer com mulatos – filhos de tapuias com todas as raças – um município tão evoluído quanto os suíços.

Algumas Datas:

  • 1° de agosto de 1916 a Lei Estadual n°1156 Rapa Tição passou a ser distrito de paz com nome oficial de Alfredo Martins, incorporado ao município de Camamu.
  • 17 de dezembro de 1930 o Decreto Estadual n°7139 o distrito à categoria de subprefeitura, ainda subordinada ao Município de Camamu.
  • 23 de junho de 1931 o Decreto Estadual n° 7455 o território de Rio Novo foi desmembrado de Camamu.
  • 8 de julho de 1931 criado a subprefeitura de Rio Novo subordinava ao Município de Jequié.
  • 31 de dezembro de 1932 o Decreto Estadual n° 8249 dividiu o Município de Rio Novo em mais três distritos: Tesouras, Barra do Rocha e Dois Irmãos.
  • 12 de dezembro de 1933 a Lei Estadual n8725 criava o Município de Rio Novo, desmembrando-o de Jequié.
  • 31 de dezembro de 1943 o decreto-lei n° 141 deu a Rio Novo o nome atual de Ipiaú – Rio Novo em língua tupi.
  • 13 de dezembro de 1952 por força da Lei Estadual 514 o Distrito de Dois Irmãos – já Ubatã – foi emancipado, separando-se de Ipiaú.
  • Posteriormente, em 1962 nova lei estadual emancipa Tesouras – já Ibirataia e Barra do Rocha.
  • Em 1965, em programa de âmbito nacional, foi escolhido entre 312 comunas – Município Modelo da Bahia.
ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).