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O cacau, a soja e o konjak

Euclides Neto

A Tarde - Salvador-BA - 1996

A tarde, 27 de junho de

Thomas Hartmann (ph.D. em cacau) traz um precioso artigo na sua coluna de A TARDE Rural, 13.6.96. Crava a lanceta na apostema, ao comentar o descaso do governo estadual e prefeitos para com a lavoura cacaueira. Com corajosa isenção, chega a dizer que o senador ACM e o governador PS “estiveram em Ilhéus para anunciar programas para o sul da Bahia, mas as questões do cacau, segundo soubemos, foram simplesmente omitidas”. Acrescenta que o festival de recursos prometidos ao Fundecau está saindo aos tiquinhos. Diz mais que os créditos federais de 1995 ainda não foram todos liberados, nem os previstos para 96, apesar de anunciados “pelo governador pela TV, mas do financiamento, nem cor, nem cheiro”.

Adiante, depois do puxão de orelhas nos políticos dá, habilmente, a sua puxadinha ao dizer que o governo estadual está fazendo muito em outras regiões. Ora muito bem.

Em A TARDE de 13.6.96, o presidente da Comissão Permanente para a Promoção do Desenvolvimento Sócio-Econômico do Oeste da Bahia, Sr. Cornélio de Piero, queixa-se que não existe política agrícola para o estado. E pergunta queixoso: “Por que ainda não deram solução política à crise da agricultura estadual, a não ser em áreas localizadas e sim a região do cacau?”.

Eis o que faz a propaganda. Em Barreiras, pensa-se que a região cacaueira está recebendo dinheiro a rodo de barcaça. Há uma semana falou-se em mais cento e tantos milhões de dólares de bancos estrangeiros, que já sobrevoavam a privilegiada lavoura. E que a vassoura-de-bruxa estava controlada. Tudo ao ritmo de Bahia Azul. Daqui sabemos, também, pela propaganda, que o sertão está azulíssimo???

Mas graças aos teos, que perderam a fé nos seus bromas, sai agora a alvissareira notícia: querem plantar na região dos grãos de ouro o milagroso konjak, da Tailândia. Até pelo nome vale a pena lavrá-lo: Amorphophallus oncophyllus. Adora o sombreamento com glicídias. Que lindo!

A palavra de ordem é plantar konjak. Sobretudo porque trazido por técnicos da multinacional Mars Incorporated. E será exportada, se tudo der certo, pois “produz uma batata cuja goma é usada para dar consistência aos produtos enlatados para a alimentação de cães e gatos”. Teremos então a soja para engordar as nédias vacas gringas e o konjak para deliciar os bichinhos de estimação das madames que os levam para irrigar os postes do Center Park. Mandioca, feijão, batata-doce nem servem para enlatar, nem cumprem a nobre missão de deleitar os cholinhos e pichanes do Primeiro Mundo.

Se ainda fosse konjaca (perdoem o trocadilho), menos mal.

Conclusão: a terra do cacau, que fornecia o manjar dos deuses, desceu depois a sobremesa de pecadores. Agora, vai produzir comida de cachorro.

 

 

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ipiaú-BA (1925-2000).