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Fazendas mistas de cacau e capim

Euclides Neto

A Tarde - Salvador-BA - 1999

Ipiaú — O sol prolongado matou até 90% de algumas roças. A vassoura-de-bruxa segue em marcha batida. Existe muito empenho em combatê-la, tendo a Ceplac à frente. Mas tudo ainda na ordem da especulação. Assim como quem vai dando um placebo ao doente. Os experimentos são recentes e, às vezes, trazidos de fora, de outras condições. Técnicos, de boa-fé, mas sem muita convicção, andaram derrubando roças e, se continuassem, já não existiriam muitos cacaueiros, pois o fungo invadiu tudo. Ainda bem que, honestamente, reconheceram a tempo o erro. O equívoco dos apressados criou certa incredulidade nas orientações dos agrônomos.

Mas queremos tratar mesmo é das fazendas que exploram gado e cacau. Acreditamos até numa solução para a bruxa. Contudo, onde a doença foi o sol, a prática mostra que não se deve plantar mais o fruto de ouro, sobretudo nas fazendas mistas, em zona intermediária, que têm a opção da carne, do leite, do queijo, da manteiga e do requeijão, sem esquecer o soro, rico em proteínas e gorduras para a criação de porcos, ajudado pela jaca e mandioca (milagrosas!). Não se trata aqui de suínos nobres, exigentes em ração balanceada, caríssimas, que nem o fazendeiro está podendo comer. Muitos produtores estão ganhando menos de um salário mínimo, só têm prejuízo. Faz melhor negócio se não colher as roças, ainda que, com o sacrifício possível, deve cuidar do cacau que restou, porque um dia choverá. (Não se conhece lugar que chovesse e deixasse de chover, como não se conhece onde não chovia, ou chovia pouco, e voltasse a melhorar o índice pluviométrico para sempre). Preservar a roça porque, mesmo com os preços aniquilados, mas com chuva, ainda é melhor do que qualquer lavoura ou criação.

Feitas tais ponderações, vamos chegar na parte mais importante. As roças das fazendas mistas que morreram ficam em terrenos excelentes e sempre houve um alto custo para combater o capim, sobretudo o colonião, precisando arrancá-lo antes de sementear. Escaparam muitos cacaueiros, sombreados por admiráveis madeiras de lei: jaqueira, jequitibá, cedro, mucitaíba, gonçalo-alves, maçaranduba, burundanga, pau-d’arco, sapucaia, além de outras, algumas menos nobres, mas que são utilíssimas. Essas roças sofridas ou mortas sempre foram cercadas para que o gado não as invadisse atrás de jaca ou do próprio cacau. Portanto, que se preserve nessas áreas a fauna e a flora, deixando o gado e animais pastar nelas, no tempo oportuno, aproveitando inclusive as gramíneas que já são invasoras. Fogo, jamais!

Assim, não se destruirá nada, controlando-se a erosão nas partes acidentadas, e teremos grande fartura de ração, deixando para os netos a convicção de que não fomos criadores de desertos, pois o que foi da Mata Atlântica ajudamos a preservar.

 

 

 

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ipiaú-BA (1925-2000).