menu play alerta alerta-t amigo bola correio duvida erro facebook whatsapp informacao instagram mais menos sucesso avancar voltar gmais twitter direita esquerda acima abaixo

Descentralização da reforma agrária

Euclides Neto

Tribuna da Bahia - Salvador - BA - 1997

 

 

 

Os estados e municípios serão chamados para participar da reforma agrária. Certo. Tanto mais que ela, agora, não é coisa de comunista. Todas as pessoas de discernimento a defendem. E quem é contra – muita gente ainda o é – tem vergonha de dizê-lo, preferindo apresentar divergência quanto ao modelo apresentado.

A Bahia já teve o seu Conselho, composto por todos os secretários, por determinação de WALDIR Pires, priorizando o programa. Saliente-se, sem prejuízo dos outros, a atuação de Ênio Mendes, da Segurança Pública: a polícia só entrava nas áreas ocupadas -- mesmo com mandado judicial – depois de esgotados todos os meios amigáveis, operação sempre bem-sucedida. Os policiais eram amigos da reforma e não inimigos. Os próprios soldados, muitos filhos de trabalhadores rurais, tratavam os ocupantes mais como aliados, fato que hoje toma força com a greve dos militares, com apoio expresso dos sem-terra.

Os abusos – também os havia – eram poucos e sempre solucionados com presteza.

O receio é que municípios – quase todos dirigidos por fazendeiros que ainda não descobriram que a reforma interessa também a eles – criem problemas no uso da estrutura de que dispõem: órgãos da saúde, estradas, educação, assistência social, agricultura. E que os recursos federais sejam desviados, até com a justificativa de que aplicados em qualquer outra atividade (sobretudo na corrupção) protege a moral da seita “Deus, Família e Propriedade”. Teme-se, igualmente, que os intendentes queiram acompanhar os trabalhos de um assentamento como sempre administraram: com autoritarismo, sem ouvir os interessados. Se assim procederem, botarão tudo a perder. Não sabem que os trabalhadores são sábios em decidir sobre as suas necessidades, conhecem melhor que os doutores o que plantar e como se organizarem. A sabedoria deles não pode ser violentada. Outro risco é escolher – até como sabotagem – assentandos que não sejam autênticos agricultores, dando preferência a cabos eleitorais escoteiros, com a irresponsabilidade estimulada de que o lote pode ser vendido porque é coisa dada pelo governo. Sem falar na criminosa perseguição contra os municípios da oposição, velha prática do atraso. O sucesso, portanto, no âmbito do estado como no do município, vai depender muito dos conselhos, que devem ser independentes, fiscalizadores e convictos de que reforma agrária não é só uma questão fundiária, mas, sobretudo, uma missão, quase religiosa. Os prefeitos precisam se convencer que uma área de assentamento resolve a fome, a habitação, o abastecimento, fomenta o comércio e diminui a violência urbana – maiores problemas das administrações atuais.

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).