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A Muda

Euclides Neto

Tribuna da Bahia - Salvador - BA - 1993

                Collor caçou marajás. Nem tanto. Só os necessários para vender a imagem de administrador probo, entrar na moda e ser candidato a presidente. Eleito, foi para o olho da rua.

                Por falta de lideranças solidamente construídas, os apressados alumiam qualquer um que esteja na parada do sucesso. Somos craques nisso. Tanto que se fala em Pelé, o rei, em Silvio Santos, o ídolo do "Quem quer dinheiro?", sempre vendendo sonhos às moçoilas desavisadas das áreas de serviço.

                 Como não se pensa no Brasil, mas no próprio futuro, serve qualquer um. O que importa é ganhar.

                 Daí os candidatos de ocasião. Se Henrique Cardoso acena com uma possível notoriedade, entra na moda. Vira presidenciável. Para tanto Justiça se lhe faça, tem uma vida acadêmica brilhante, é correto, mas politicamente só é sofrível. Ainda é cedo.

                 Os mais novos são Passarinho e Magalhães (este, menos mal, pois que é o de Pernambuco). Assumem a delegacia da CPI. Entraram no vídeo como uma dupla de sucesso momentâneo, uma espécie de Chitãozinho e Xororó (com x ou com ch?).

                Por falta de gente mais interessante, o de Xapuri (êta lugarzinho famoso, tem dado é candidato do Alvorada; o outro é Jatene: constituindo-se na maior concentração de ministros por pé de mato) e o pernambucano viram uma possível dupla recomendável. O uirapuru da Amazônia tem vida maviosa. Atravessa toda a ditadura sem tatuar as mãos na pólvora das vítimas torturadas. Só fazia ouvir os gritos nos porões. Aí calava o canto. Só. Entra e sai do lodaçal de Collor sem uma mancha na túnica. Até parece que não fez parte disso. Veste o dólmã quando não interessa vergar o jaquetão. Espécie de mocinha pudica que morou por aí e continua donzela. Tão sereno e hábil que seu recente namoro temporão deixa de sugerir maledicências, próprias da corte. Pelo contrário, sai perfumado pelos encantos de um amor romântico.

                 Apareceu na televisão, pode ser presidenciável. Mas quem não tem cachorro, caça com gato. Não sei por que milagre Roberto Marinho ainda não foi lembrado. Certamente muitos políticos já pensaram nele. Quanto ao conteúdo do livro "A história secreta da Rede Globo”, não tem importância, a mídia é capaz de transformar gente enrolada no caso da NEC em monge franciscano, mesmo quem confessou: "Sim, eu uso o poder". Continuamos arriscando entregar o País em mãos erradas. Depois vem o arrependimento. E fica tarde, porque o mal já está feito. Irremediavelmente.

                 Antônio Britto realiza um bom trabalho. Mas, na realidade, é presidenciável pela assistência às longas horas da agonia de Tancredo. Que ninguém esquece. Também ainda é cedo.

                 Felizmente, o Romário foi embora. Faz seus gols lá na Europa. Bem longe. No outro lado do mar. Se estivesse aqui, não faltaria quem o chamasse às urnas.

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ipiaú-BA (1925-2000).