A jogada
Euclides Neto
Tribuna da Bahia - Salvador - BA - 1994
Durante três anos o ex-governador A. Carlos trabalhou a sua candidatura à Presidência da República. Estirou a Linha Verde em confronto à Linha Vermelha de Leonel Brizola, desafiando-o, já em campanha eleitoral. Consertou teatro, museus, enfeitou o Pelourinho (feitos interessantes), atraiu artistas, turistas, a Ibero-americana, tudo em largo estilo. Conseguiu o monumental Sarah Kubitschek, com inauguração retumbante. Desfilou com o peito estufado de estadista a tiracolo do presidente Mário Soares. Apareceu ao lado da princesa Diana. Brigou a torto e a direito. Agrediu a Justiça. Soltou ladrões espetacularmente. Colocou-se na oposição ao presidente Itamar Franco, tentou atrapalhar o ministro Jutahy Magalhães. Processou supostos corruptos, copiando o surrado estilo Collor, seu aluno e mestre. Tudo a feição de “essa alma quer falar”.
Ajudando a doirar o candidato, sempre esteve a Rede Globo, fazendo-o paladino da moralidade! Herói nacional! Apresentando-o no horário eleitoral-gratuito-temporão do JN, quase todos os dias, sob o pretexto de mostrar obras e bravatas. Inclusive encontros com megaempresários paulistas e cariocas, viagens ao exterior no eixo Londres-Nova Iorque, na alta demagogia do figurino eleitoral. Repetiu, em maior escala, o que fez quando ministro das Comunicações, ao inaugurar até orelhão de esquina, mostrando bucólicas paisagens das cidades da Bahia, acompanhadas de músicas noveleiras, associando o Ministério ao próprio nome, em subliminar propaganda ao governo do estado.
Mas Roberto Marinho, que foi capaz de artesanar Collor, desconhecido governador da pequetita Alagoas, não teve forças de levantar o poderoso ex-ministro, ex-governador ao enfado, amigo das elites. Teimosas pesquisas encomendadas o colocaram sempre carregando o fifó na preferência dos eleitores. Gorou. E olha que a mídia foi capaz de, em 3 meses, em um país politizado como a Itália, eleger o seu mandatário. Aqui nada adiantou. E não foi por falta de santo forte, culto à memória de mãe de santo, sessão espírita, eis que ele frequenta a tudo com a mesma devoção e sinceridade.
Com um par de cartas fracas, na mão tenta o blefe. Aparece o otário PSDB, com todas as vestais, que saiu do PMDB sob a alegação de que o partido de Ulisses estava degenerado, e, agora, faz força para entrar no PFL, que dispensa adjetivos. Pode? Por outro lado, fica claro que o mito do gênio político de AC escafedeu-se. Nem a poderosa mídia foi capaz de fazê-lo candidato.
Mas deve estar a rir: não precisa defender-se; basta mostrar que os outros são iguais a ele. Repete-se a eleição de Tancredo, que o elevou a representante da Rede Globo no governo.