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A dança das siglas

Euclides Neto

Tribuna da Bahia - Salvador-BA - 1992

Quando a polícia procura descobrir um crime e sabe que alguém o confessou em algum lugar, a primeira medida é chamar o delinquente para depor. A confissão não é prova definitiva, mas constitui forte elemento para convencer. Sendo assim, o líder do governo, o senador Ney Maranhão (imagine-se isso no Japão ou na Suíça), que declarou ser um sonegador de impostos, precisa ser ouvido. Disse mais: todos os empresários têm o rabo preso, isto é, na qualidade de ratos, estão com o rabo seguro na ratoeira.

Mário Amato (agora se sabe por que se afastaria do Brasil caso Lula fosse eleito), presidente da Fiesp, eleitor de FCM, em momento de rara sinceridade, afirma que “todos nós (eles) somos corruptos”.

Com tais declarações, no mínimo, alguém da polícia, ou do fisco, ou sei lá de onde, deve tomar uma providência (alô, Dr. Junqueira!). Aí não se trata mais de desobediência civil. Já é caso de desafio da quadrilha de sonegadores e corruptos contra a impotência e impunidade das autoridades.

Isso de um lado. Do outro, Ulisses Guimarães, líder sem crachá do Congresso, ressabiado com a vivência histórica, apressa-se em defender a posse de Itamar Franco, em caso de impeachment. Ora, se a Lei Maior manda que o vice assuma nos impedimentos do Presidente, é despiciendo o cuidado. Está evidente o óbvio. Salvo se o velho lutador enxerga lobisomens ou chacais que sempre rondam as carniças.

De qualquer modo, os brasileiros querem a lâmina do bisturi indo à raiz do tumor, sem ódio nem prevenção. Com serenidade e justiça. O talho no baixo ventre da administração federal é para extirpar o que lá estiver podre. Jamais fechar o paciente sob a alegação de que não vale mais a pena operar. Não acreditamos em metástase, apesar de tudo. No governo, existe muita gente séria, sobretudo entre os seus funcionários de carreira. Entre os políticos também.

Quando se investiga um crime não há intocável, por mais presidente da República que seja. Aliás. FCM deve querer a apuração de tudo. Mesmo sabendo que o PCF, denunciado pelo PCM (meu Deus, quanta coincidência do C da corrupção nas siglas), tesoureiro da campanha, é tido e havido como um Al Capone. Quem o escolheu, sendo do mesmo arraial, conhecia-o e tem a maior parcela de culpa no episódio. Tesoureiro que, após as eleições, ganhou notoriedade com o nada discreto “Morcego Negro” nos céus da corrupção. Certamente muitos entraram em rota de colisão com ele, por inveja, por despeito, porque estava passando a perna nos demais. Com todos íntimos do presidente, nos palácios, onde até coisas mais recônditas chegavam às esquinas, inclusive o triangulozinho branco de peças íntimas mostradas através de pernas mal cruzadas, por que os choques melados de interesses pecuniários não chegariam ao FCM?

O que importa agora, se for o caso, é cumprir a Constituição, sem levantar qualquer dúvida, para não enfraquecê-la. E não ligar muito para ACM, que não concorda com a posse de Itamar, alegando, convicto, que o vice não tem condições “morais e políticas” de assumir a Presidência. Os votos de 34 milhões de brasileiros nada valem? Cuidado com ACM, gente. A esta altura ele já tenta se aproximar do vice, criar um fato, passando papa na boca dos ingênuos. Aí, sim, ACM é ph.D. Na campanha passada, FCM xingava os ministros de Sarney de ladrões. De público, ACM não estava claramente com FCM. Mas nos camarins era seu fiel escudeiro. Examinando-se bem os fatos, percebe-se que o maranhense também fazia parte do esquema. Agora, se Itamar, que rima com Ribamar, assumir a Presidência, o primeiro a acompanhá-lo na subida da rampa (jamais ACM acompanhou alguém na descida) é ACM. Ninguém o supera nessa ambivalência.

Quando o governo Figueiredo, que também tem rima, entrou em coma, ACM caiu fora. Nem Tancredo, que tinha manhas de 7 mineiros, escapou.

Se alguns estão procurando a casa funerária para encomendar o caixão de FCM, em decorrência das denúncias de PCM contra PCF, ACM já está pedindo a mão da viúva Itamar em casamento.

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).