Os magros, esta pequena obra prima
Vitor Hugo Fernandes Martins
Orelha em “Os magros” - quarta edição - 2012
Os magros, do ficcionista baiano Euclides Neto (1925-2000), completa, em 2012, 51 anos de publicação. Trata-se, a meu juízo, de uma pequena obra-prima da prosa de ficção longa brasileira. Apesar de singelos pecadilhos pinçados aqui e acolá, a cada leitura que faço desta obra telúrica como foi a vida daquele que a concebeu, mais me convenço de que Os magros nada deve a Terras do sem fim (1942) e a Corpo vivo (1962), dos também baianos Jorge Amado e Adonias Filho, respectivamente. Por quê? Porque suporta, como os dois romances citados, releituras; não é texto datado, pois. O que ele, o romancista de Os magros, escreveu ontem, há mais de meio século, não valerá hoje? Creio firmemente que sim.
É já um truísmo ler em Os magros as influências de Vidas secas (1938), de Graciliano Ramos e, portanto, do neorrealismo. Certo, não há aqui como negá-las. Porém, Euclides Neto tem matéria e maneira próprias. Assim, tem na terra mais do que um topos, uma personagem, a qual se alimenta dos homens, em vez de alimentá-los. Mas se isto aconteceu/acontece/acontecerá? A culpa não é dela; é sim do lobo do homem chamado homem, conforme preconizou Thomas Hobbes. Por meio da leitura deste romance euclidiano (e das demais obras ficcionais e não ficcionais do autor, sublinhe-se), chega quem o lê à conclusão de que a Arte pode ser, sim, a um tempo, meio e fim.
O livro, em sua arquitetura narrativa, pela técnica do contraponto, espelha o que representa. Entenda-se: as classes sociais, a dos magros (do “agregado” João, sua mulher e sua prole) e a dos gordos (do dr. Jorge e sua “família”), estão iconicamente separadas pelas sequências alternadas dos capítulos. Isto, para mim, é antes acerto que defeito, porque Euclides Neto por aí soube, dialeticamente (e não maniquiesticamente), representar a riqueza, o excesso dos magros – pelo caráter e pela ética, e ainda pela fertilidade de Isabel –, assim como a pobreza, a escassez dos gordos – pelo desamor, pela neurose/psicose do casal, dr. Jorge/Dona Helena, e pela infertilidade desta. Enfim, um noutro. Como manda a boa e velha dialética.

