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Cesta Básica

Euclides Neto

Tribuna da Bahia - Salvador - BA - 1993

               Defendo o atual governador da Bahia. Sendo nascido e criado na capital, não tem obrigação de saber que feijão e arroz têm que ser plantados para virar comida. Político a vida inteira, sua lavoura é o voto, que semeia, limpa, chega terra e colhe com maestria. Do campo, só aprendeu com as galinhas: se põe um ovo, solta as trombetas, anunciando despudoradamente o feito. Também aprendeu com os índios: não dispensa o cocar vistoso e collorido (com dois LL). Aprecia as obras trioeletrizáveis, parideiras de voto: Hospital Ortopédico, pouco importando que milhares de leitos estejam desativados, sobretudo no interior; Linha Verde para o lazer, apesar de as estradas andarem intransitáveis; Teatro Castro Alves, sem incomodar-se que as escolas primárias estejam carentes. Faço justiça quanto ao Pelourinho, pois que, se não cuidado em tempo, perde-se um patrimônio histórico, jamais resgatável.

                 Conhecendo o interior pela rama, não está nas suas cogitações a distribuição sistemática de sementes, a comercialização da safra do pequeno lavrador, aquele que, em regime familiar, ainda é o grande produtor de alimentos, empregando-se e aos seus aderentes. Imagina a solução da comida com os 70 milhões de toneladas de Collor, mais uma mentira do esconjuro.

                O atual governador da Bahia manda no Estado há 25 anos: diretamente, indiretamente com seus nomeados, e manipulando o governo federal para que as verbas não sejam liberadas por intermédio de outros baianos. Mas a Bahia passa fome. Sua Excelência é capaz de inaugurar uma lojinha de cesta básica no arraial, com todo o estardalhaço televisionado. Contudo, desconhece que o alimento vem da terra e não dos holofotes.

                A realidade está aí. A cesta básica na Bahia é a mais cara do Brasil. Será que as terras do Piauí, Ceará, Paraíba são melhores que as nossas? Ou será que não temos governo para incrementar aquilo que a Índia (com Indira e Swaminathan) conseguiu, estocando 50 milhões de toneladas de grãos, igualando-se à fantástica Comunidade Europeia? Fizeram-no com distribuição de terras. Aqui se extinguiu a Secretaria da Reforma Agrária. Pensa-se na megalomania da grande produção de grãos para exportar.

                 As lojas da cesta básica servem mais à demagogia. Mas, se assistir o lavrador, haverá comida e mais impostos.

                 A propaganda insidiosa termina atordoando até os mais avisados. De tanto repetir feitos, inaugurando bodegas de cestas básicas, vende-se a imagem de que o governo está em efervescência de obras. Sobretudo na capital, onde mais se forma a opinião pública.

                 Resta uma esperança: convidar os governadores de Sergipe e Pernambuco, de onde vem grande parte do que comemos, para nos ensinar. Mas leve-se em conta, ainda em defesa do nosso governador, que moramos no deserto, as terras de lá são mais férteis; e as chuvas mais abundantes.

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).