menu play alerta alerta-t amigo bola correio duvida erro facebook whatsapp informacao instagram mais menos sucesso avancar voltar gmais twitter direita esquerda acima abaixo

A palhaçada do cacau

Euclides Neto

Tribuna da Bahia - Salvador-BA - 1995

Temos que confessar o nosso primarismo. Não passamos de incapazes. Botocudos mesmo. Somos tolos eleitores, passíveis de ser enganados com uma camisa de bulgariana ou uma cesta básica.

Vejamos o crédito para o combate à vassoura-de-bruxa. Enquanto no Sul bota 1.000 caminhões na estrada para pressionar o governo, escorraçando o presidente, depois de receberem quase tudo, nós, aqui, nos postamos de joelhos para agradecer a graça alcançada por um ovo que ainda está no fiofó da galinha.

Faz anos que determinado cidadão se apresentou como o arcanjo da lavoura, prometendo créditos mansos.

Rolou tempo e há cerca de um ano o ministro Ciro Gomes veio à Bahia somente para garantir que os recursos já estavam no Aeroporto Dois de Julho. Os produtores crédulos. E a vassoura-de-bruxa, que não leva em conta a demagogia, avançando. O sol também. O preço rasteiro.

Desde maio passado existe a notícia do tão anunciado dinheiro.

Agora, novo espetáculo, pois se passou em um teatro de Ilhéus. Melhor em um picadeiro de circo. Presentes, o senador Antonio Carlos, com o governador Paulo Souto no coldre. Nada mais ridículo.

Triste lavoura, para a qual os empréstimos deveriam fluir com a naturalidade das águas dos riachos, mas que aparecem como ato de heroísmo e caridade dos espertos. Dando logo na manchete de jornais que chegarão “340 mi” amanhã, para, no texto, comunicar que somente 100 agora, e o resto às calendas gregas.

Triste do nosso Banco do Brasil, que está sendo obrigado a servir também de palco — ele que sempre foi infenso a tais métodos e continua através dos seus bravos funcionários — à palhaçada.

Aguardemos. Quando o sol matava a lavoura não apareciam recursos. Com a chuva, o que significa a melhora do doente que venceu o coma, chegam os curandeiros. Mas com exigências de certidões negativas do INSS, Imposto Territorial Rural, protestos, Justiça do Trabalho, fiscais, alienação de bens. Além da obrigatoriedade de aval ou hipoteca. E mais penhor da safra. Como se os lavradores nunca tivessem honrado os seus compromissos, onerados com todas as extorsões. Só faltam exigir atestado pelo Cartório Eleitoral em quem votou nas últimas eleições, atestado de vacina contra varíola e de burrice. Dado à crise, somente os raros que não precisam terão acesso ao guichê do banco.

Tudo isso significa o hospital exigir comprovante de saúde para internar o doente.

A demagogia é tão bem elaborada que temos que ser gratos pelo resto da vida pelo gesto de caridade e clemência por sermos cacauicultores. Tendo que pagar em votos e subserviência.

O engodo mal se iniciou!

ilustração: Adrianne Gallinari
Euclides Neto
Euclides Neto: Escritor, advogado e político da região de Ilhéus (1925-2000).